Para Marta Vieira da Silva.
Há uma certa poesia nos olhos fechados duma criança enquanto dorme. Nos olhos da Marta há a poesia de quem sonha depois de um dia a brincar entre os livros e se deita cansada de ter esgotado a vida que aquele dia lhe deu.
Quando fecha os olhos diz devagar "Não tenho sono" só para poder vir para a minha cama. Então eu abro os lençóis e ela adormece junto de mim. Eu fico guardado nos sonhos dela, porque os sonhos da Marta traçam o labirinto das minhas esperanças até que tudo se perca quando lhe toco os cabelos. A partir daí já mais nada importa, o mundo pára na seda dos cabelos dela: a Marta é maior que o mundo porque o seu desejo de viver é tão grande e ainda assim cabe na pequena biblioteca onde a Marta gasta os seus dias em brincadeiras e sendo grande não vai além dos muros do jardim da casa da avó que vão até onde chega o mar.
A Marta tem uma doçura verde na sua ânsia de ser crescida. E eu, enquanto ela dorme e lhe toco nos cabelos, tenho uma ânsia doce que a vida passe gentilmente por ela.
Mas a vida nunca passa gentilmente.
Mas nada disso importa enquanto a Marta dorme e a poesia se desenha em mim.
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