domingo, maio 11, 2008

Triptych

I

Let us be silent
Now.
Let us not say
A word.
An in this silence let us
Hear.
For it is in silence that all words
May be spoken.

II

Let us say a kiss.
Let us open our mouths for a kiss
To be said.
For when is a kiss better said
Then when
We open our mouths and you
Can hear
No sound rather
Then that
Of two mouths touching in a kiss?

III

Let us
Come out
To see both roses and sun.
Let us
See
Where birds fly when the afternoon falls.
Lets us come out.
Let us
Be out...
and slowly, oh ever so slowly,
Just let us breathe.

Tardes em crepúsculo ou Saudades do Sul

Às vezes a luz cai
Assim
Sobre Lisboa.

É o tempo do crepúsculo.

As tardes são agora
Longas e lisas
Como o voo rasante dos pássaros.

E eu guardo saudades
Do sul.

quinta-feira, maio 08, 2008

Ontem não te vi em Babilónia

Aqui digas,

Casa,

Ainda que ontem não me tenhas visto em Babilónia.

Excerto ou Ensaio para "Conto de Gustavo-IV"

Ensaiava então um gesto que lhe saia naturalmente: envolvia-lhe o braço direito em torno da cintura. Agarrava-o numa violência de amante plácido. Gustavo deixava-se ir, ainda com medo de um par de olhos que espreitasse em algum canto. Depois esquecia. Enrolava os braços no pescoço dele despreocupadamente. Nunca se beijavam nestas alturas.

De um gesto diário aos olhos em provocação

Surpreendi-lhe um gesto. Era um gesto habitual que costumava ter. Cerrava os dentes com força e quase rasgava o beiço de cada vez que o fazia. Depois parava, era como quem se recompõe. Olhava para mim, o beiço encarnado, sobejamente inchado. Olhava em ar de desafio. Era numa altura em que os olhos dele diziam muita coisa.

terça-feira, maio 06, 2008

Poema da Fertilidade

Em vaso de terra,

Em chão que é fértil

Ergue a semente nova do dia

E a cada grão repete

Vaso, terra, chão.

Em palavras

Para o Sérgio e o Stjin com todo o meu carinho.

Ainda que eu pudesse dizer-vos em palavras
Do meu agradecimento
Deixem que o silêncio fale por mim.

De cada vez que o puderem ouvir ele dir-vos-á muito mais do que eu.

"Fim d'Época" e "Geneticamente Fúteis"

Tenho por hábito passear entre a Baixa e o Chiado tanto como tenho o hábito de não escrever sobre mim e aquilo que faço, ou pelo menos não directamente. O primeiro prende-se com o meu lado de alpinista social, o segundo com o meu ar pseudo-intelectual de quem procura estar ausente à escrita que produz. Um dos sítios que encontrei para melhor conjugar estas duas facetas da pessoa que sou eu é um simpático cadeirão preto colocado de costas para a janela da segunda sala da Bertrand Chiado. É um dos espaços mais agradáveis de leitura que Lisboa oferece e já cheguei a passar tempos bem largos ai sentado, normalmente ao cair da tarde, perdido e absorto em livros, ausente de qualquer outra realidade.

A última vez que lá estive tinha de facto um propósito: ia em busca de um presente para umas primas pequenas. Presente esse que os deuses haviam guardado para mim num canto escondido da última sala- era o único volume em toda a Lisboa. E a par encontrei mais dois livros que levaram a que me sentasse no dito cadeirão: "Fim d'Época" de Lourenço Pereira Coutinho e "Geneticamente Fúteis" de Cláudio Ramos.

Uma vez que apenas li ambos en passant vou guardar as críticas e ater-me a breves comentários que me parecem interessantes. "Fim d'Época" passa-se na Lisboa da primeira década do Século XX tendo como personagem principal o Dr. Miguel Sebastião Telles de Almeida, filho dos Condes de Valverde. As descrições ricas e o tratamento cuidado da época, fundado nos conhecimentos do autor que além de historiador já publicou ensaios sobre a época, fazem da obra um agradável retrato da alta sociedade lisboeta e das suas preocupações políticas, sociais e económicas que por sua vez a torna agradável a quem, como eu, vive em paixão constante pela História Social. "Genéticamente Fúteis" passa-se na Lisboa da primeira década do Século XXI. Conta a história do assassinato e consequente investigação do crime dum afamado colunista social e da trupe que vivia em seu redor. A escrita não é das melhores e, muito num estilo da literatura-light, é pouco profunda atendendo mais às frivolidades da acção que à importância quer da descrição, quer da reflecção. Notemos agora aspectos interessantes: se pusermos as classes que cada livro representa, que pretende ser a mesma com 100 anos de diferença, nós é que encontraremos diferenças abismais. Não só a maneira de estar, mas sobretudo a maneira de ver e entender o mundo, bem como a imagem que certa classe projecta de si mesma mudou radicalmente, talvez como nunca antes tenha mudado num tão curto espaço de tempo. A família e as soirées, a arte de receber e de estar com amigos, as discussões sobre o tenso ambiente político de "Fim d'Época" são substituídas em "Geneticamente Fúteis" pelas festas e vernisages, a arte de enganar e fazer amigos proveitosos e as discussões sobre o cabeleireiro ou o último desfile daquele costureiro famosíssimo.

Dizer que prefiro um ao outro está longe do ambito desta crónica. Tenho as minhas escolhas pessoais e reservo a outros o direito de terem as suas. Note-se apenas a mudança de uma elite culta e preocupada, ainda que um pouco desfazada da realidade, para uma pseudo-elite sem ethos ou mesmo savoir-faire que o seu autor retrata como sendo de facto geneticamente fútil.

Se puderem e quiserem vão a uma livraria peguem nos dois livros, escolham um canto e tirem as vossas próprias conclusões. Só peço que me deixem o meu cadeirão contra a janela.