Escrever sobre nós e sobre aquilo que sentimos não guarda nada em si de extraordinário. Qualquer um é capaz de escrever sobre o que tem aflorado na pele.
Escrever sobre o resto, tudo aquilo que existe além de nós, é bem mais difícil. Criar outros Eus (qualquer personagem criada por nós é sempre um alter ego) implica ao mesmo tempo uma catábase e uma anábase em nós mesmos, porque a escrita, como qualquer forma de produção artística, é o melhor exemplo do acto fenomenológico. Nada do que existe para nós pode ser exterior a nós mesmos, o que não impede que muitas dessas coisas nos sejam estranhas. A viagem à percepção dessas coisas que temos interiorizadas mas em campo inexplorado representa em simultâneo a dor profunda de arrancar algo de nós e a alegria maior de nos conhecermos mais profundamente.
Qualquer personagem nasce das dores do seu criador, porquanto qualquer personagem é uma parte desse mesmo criador a que foi dada forma e nome concreto. A partir do momento que algo tem nome é real e existe! A Palavra define tudo.
Quem escreve, escreve assim para ser Deus não de si mesmo, mas em si mesmo.
1 comentário:
escrever só porque sim, ou porque é dia não. escrever para ti, escrever contigo, ver-te escrever, ler o que escreves.
e saudades. tantas.
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